quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O Inferno: A separação de Deus.

A existência do inferno é atestada por numerosas passagens da Sagrada Escritura, pela Tradição e pelo Magistério Eclesiástico. E grandes mestres da vida espiritual, como Santo Inácio de Loiola, recomendam que se medite sobre esse local de tormentos eternos, como medida salutar para se alcançar a salvação.
Imagine alguém numa situação de pesadelo, sofrendo todas as doenças possíveis, juntas, ao mesmo tempo. Quer dizer :  tivesse no coração, a dor do enfarte; nos olhos, o tormento produzido por um tumor em cada olho; na espinha dorsal, e com reflexos em todo o aparelho sensitivo, os efeitos de um canivete de fogo que estivesse continuamente cortando a espinha de alto a baixo, e triturando e esmigalhando, com todos aqueles colapso e dores; no estômago, todas as náuseas imagináveis (a náusea é uma das sensações mais desagradáveis que pode haver), mas, ao mesmo tempo, nos rins, sensação de uma pedra enorme que não passa e os congestiona; sentisse todo o mal-estar de um homem com o sangue altamente infeccionado, no qual corressem continuamente as piores toxinas e venenos.
 Suponha que das narinas dessa pessoa saísse continuamente o pus mais asqueroso; nos ouvidos houvesse vermes roendo continuamente os tímpanos, e produzindo dores de estalar. Em uma palavra, houvesse em cada célula a maior dor de que aquela célula é capaz, de maneira que a pessoa sentisse, continuamente, eternamente, sem nenhuma interrupção, milhões de martelos descarregando sobre si, comprimindo e chagando continuamente seu corpo.
Pois bem, tudo isso é uma imagem fraca, irreal, dos tormentos que o corpo padece no inferno, porque os sofrimentos infernais são incomparavelmente piores do que esses. Pois os tormentos acima descritos ainda podemos imaginá-los enquanto que as torturas infernais são estritamente inimagináveis.
Para se ter uma idéia disso, Santo Inácio de Loiola faz a comparação entre o fogo do inferno e o fogo da terra.
Tomemos uma chama. Ninguém gostaria de ser condenado a viver dentro daquela chama, queimando-se eternamente. Bastaria propor a alguém que pusesse a mão na chama ou somente o dedo indicador, para que a pessoa sustentasse uma batalha de anos para evitar isso. O fogo do inferno é tão mais devorador do que o fogo da terra, que se se colocasse um rochedo (podemos imaginar o Pão de Açúcar) nas chamas infernais ele se consumiria imediatamente, a ponto de não restar do mesmo senão um monte de cinzas. Tal é o fogo do inferno.
Imaginemos agora um corpo vivo – porque o que vai para o inferno não é o cadáver, é o corpo ressuscitado e com vida- posto eternamente num fogo capaz de, num segundo, liquefazer e queimar completamente um rochedo.
Santo Inácio de Loiola, em seus “Exercícios Espirituais”, apresenta a meditação do inferno, recomendando ao retirante “tocar, de algum modo, aquele fogo, cuja ação queima a própria alma”. Com efeito, as almas dos condenados, mortos antes da ressurreição dos corpos que ocorrerá no fim do mundo, são atormentadas diretamente pelas chamas do inferno.


O CORPO NÃO SE DESINTEGRA


Se todo esse tormento atingisse o homem e, ao cabo de um minuto, de uma hora, de um dia que fosse, passasse, isto seria na realidade terrível, mas, afinal, seria algo passageiro. No entanto, não é o que se dá com o inferno. O perecido é ali queimado continuamente e nunca o seu corpo se desintegra, ele nunca morre, nunca acaba. De maneira que a chama, ao mesmo tempo o torra e o mantém íntegro. O tormento que ele sofre ao cabo de cinco quinquilhões de anos é o mesmo que padece no primeiro momento em que tocou tal fogo. E aquela chama devoradora, que não pára!
Além do fogo há outros tormentos internos e externos: sensações desagradáveis, cheiros pútridos, visões de coisas trágicas, audições de cacofonias monstruosas. No paladar, a sensação de ingerir as matérias mais purulentas e asquerosas, continuamente. Esta é a situação de um condenado no inferno.
Como é verdade o que diz o Espírito Santo, na Sagrada Escritura: “Medita nos teus novíssimos e não pecarás eternamente!” (Ecl. 7,40).


 A VISÃO DO INFERNO EM VIDA


O Criador, em sua misericórdia, tanto quer nos livrar do inferno que dispôs que algumas almas eleitas fossem lá conduzidas em vida, para que os homens soubessem, através dessas testemunhas, o que está preparado ao homem que ousa violar os Mandamentos de seu Deus.
Entre as almas privilegiadas que tiveram a graça de, em vida, ver o inferno encontra-se a grande mística espanhola do século XVI, Santa Teresa de Jesus:


“Havia já muito tempo que o Senhor me fazia muitas das mercês que referi e outras grandíssimas, quando um dia, estando em oração, achei-me subitamente, ao que me parecia, metida corpo e alma no inferno. Entendi que queria o Senhor dar-me a ver o lugar que aí me haviam aparelhado os demônios, e eu merecera por’ meus pecados. Durou brevíssimo tempo, mas, ainda que vivesse muitos anos, tenho por impossível olvidá-lo. Pareceu-me a entrada um beco bem longo e estreito, semelhante a um forno muito baixo, escuro e apertado. O solo tinha aparência duma água, ou antes, dum lodo sujíssimo e de pestilencial odor, cheio de répteis venenosos. No fundo havia uma concavidade, aberta numa parede, a modo de armário, onde me vi encerrada estreitíssimamente. Tudo isto era deleitoso à vista, em comparação do que ali senti. Entretanto, o que escrevi está muito aquém da verdade.” 


Mas não foi só nos séculos passados que a Providência quis alertar os homens para os horrores do inferno, mas também no atual que estadeia impiedade e a luxúria. Com efeito, em 1923, falecia em odor de santidade a religiosa espanhola sóror Josefa Menéndez, da Société du Sacré Coeur de Jesus.
Assim, narra ela uma de suas descidas ao inferno: “Então arrastaram-me por um longo caminho mergulhado em escuridão. Comecei a ouvir de todos os lados berros medonhos. Pelas paredes do estreito corredor havia nichos, uns em frente dos outros, de onde saía fumaça quase sem chama e com cheiro intolerável. Dali, vozes proferiam toda espécie de blasfêmias e palavras impuras.
“Algumas maldiziam seus próprios corpos. Outras seus pais: Outras censuravam a si mesmas por não terem aproveitado tais ocasiões ou tais luzes para abandonarem o mal. Era uma confusão de berros, de raiva e de desespero.”
“Fui puxada através dessa espécie de corredor que não tinha mais fim. Depois deram-me um violento empurrão que me enfiou, dobrada entre tábuas incendiadas e espetada de lado a lado por agulhas em brasa. Diante de mim, almas amaldiçoavam e blasfemavam. Foi o que mais me fez sofrer.”
“Mas o que não pode ter comparação com tormento algum é a angústia da alma que se vê separada de Deus.” 


 INSTRUMENTO DA JUSTIÇA DIVINA


Deus é infinito e por isso tudo o que Ele faz é marcado por esse atributo de sua divindade. Assim, quando Ele premia os justos, é superabundante em sua misericórdia. Mas também é superabundante quando se trata de punir o pecador que, tendo recusado os incontáveis chamados de sua graça, de ter desprezado seus inúmeros perdões, morre em estado de pecado mortal. Assim ensinam os teólogos, com base na Sagrada Escritura, ser o inferno o pior dos males enquanto suplício e aplicação da vingança divina:
1. Porque aquele fogo é um fogo de enxofre, segundo aquelas palavras do Real Profeta: Fará chover sobre eles suas redes; o fogo, o enxofre, o vento das tempestades será o cálice que Ihes prepare (SI. 10,7). 


2. É um fogo muito ardente, muito cruel e penetrante. 


3. Consome diretamente as almas do mesmo modo que os corpos. 


4. Tal fogo não ilumina; é uma densa treva, e atormenta os réprobos não só com sua intensidade, mas também com suas trevas, sua fumaça e seu insuportável odor de enxofre. 

A esse propósito, diz São João no Apocalipse: “E este (o condenado) beberá do vinho do furor de Deus, que foi derramado sem mistura na taça de sua ira e será atormentado com o fogo e o enxofre diante dos santos anjos e diante do Cordeiro. E o fumo do seu tormento subirá pelos séculos dos séculos e não terão repouso. Dia e noite aqueles que adorarem a besta e sua imagem, e os que receberem a marca do seu nome” (Apoc. 14, 10-11).


“Meditai estas terríveis verdades, diz Santo Agostinho, e oponde aquele fogo do inferno às chamas da paixão e da cobiça que os atormentam nesta vida. O fogo material de que nos servimos se apodera dos objetos que recebe e os consome; mas o fogo do inferno devora os réprobos e os conserva inteiramente para castigo”.


SEPARAÇÃO DE DEUS – O maior tormento


Por ser Deus infinitamente sábio, infinitamente bom e infinitamente belo, ele é infinitamente cativante: Deus atrai. Deus empolga, Deus interessa; a pessoa fica ávida de ver todos os seus movimentos, tudo quanto se passa dentro de sua essência, que iremos contemplar face a face; de maneira que tudo quanto o Céu apresenta de belo nada é em comparação com o que contemplaremos diretamente em Deus.
O condenado sabe que todos os bem-aventurados estão vendo a Deus. Ele, porém, não pode fazê-lo, está mantido à distância, é o escorraçado, para quem isto foi proibido, porque ele não é digno, está marginalizado. E fácil imaginar o tormento que isso deve causar nele, devorado pela inveja e pelo ódio. Pode-se então ter uma idéia dos mil tormentos que percorrem a alma de um perecido.


Com efeito, ensina a teologia, a separação ele Deus é a pena principal dos condenados. Um Deus perdido, o bem por excelência, o autor e o manancial de toda a felicidade. O desejo de ser feliz é um sentimento profundo, que domina o homem e o segue por toda a parte; é o móvel de todos os nossos passos e ações. 

Tal desejo é obra do próprio Deus, e só Deus pode satisfazê-lo: criou o coração do homem para Si e só Ele pode enchê-la. Por isso, aquele coração chama o seu Deus como a seu único e soberano bem …
Na Terra, o homem, distraído e enganado por tudo o que está ao seu redor, não reflete bastante sobre essa verdade, que passa desapercebida para as pessoas do mundo; mas no inferno não há distrações, porque já não há ilusão. A alma do pecador, que dormia na terra, desperta no inferno e desperta para não voltar a dormir. Vê a seu Deus como seu único bem, como o único objeto que poderia fazê-la feliz: sente, por sua natureza, intensa atração para seu criador; mas um braço invisível a detém, a rechaça, um intervalo imenso a separa de seu Deus. Cadeias que não pode romper a detêm em seu cativeiro.


 Nenhum de nós gosta de ser odiado, imaginemos o precito sentir contra si, eternamente, como que um olho iracundo que nunca deixa de o olhar com cólera, sendo ele um excomungado, um rejeitado, um miserável, por toda a eternidade.


Todo esse ódio, que cai como um gládio de fogo sobre a cabeça do precito, no inferno, tem como princípio e causa primeira a espantosa maldição com que fulmina o réprobo no momento de sua morte. 

Com efeito, a partir do instante em que o pecador entra na eternidade, por causa de um só pecado mortal, ele ouve do divino Juiz esta terrível sentença: “Afasta-te de mim maldito, paro o fogo eterno”
E o condenado estará então eternamente sob o peso daquela maldição divina. Tal é o desgraçado estado dos condenados.


É muito oportuno, ao concluirmos estas linhas, relembrar a necessidade imperiosa desse rechaço radical, tendo em vista que o influxo pestilêncial de Satanás se torna cada vez mais intenso em nossos dias.Na medida em que os últimos vestígios da civilização cristã vão sendo extintos, o neopaganismo vai dominando sempre mais a civilização e as manifestações da anticultura hodiernas.


FONTE: Resvista Catoliscismo


1. Plinio Corrêa de Oliveira, conferência pronunciada para sócios e cooperadores da TFP. em 22 de setembro de 1973.

2. Santa Teresa de Jesus, Livro da Vida. em Obras Completas, tomo I, traduzidas pelas carmelitas descalças do convento de Santa Teresa do Rio de Janeiro, Vozes, Petrópolis, 1946.

3. Josefa Menéndez.Apelo ao Amor, Editora Santa Maria. Rio de Janeiro. 2ª edição, 1953, pp. 188·9.

4. Padre Barbier. Tesoros de Cornelio a Lapide, tomo II, Madrid-Barcelona. 1882, pp. 458 a 467.

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