quarta-feira, 27 de novembro de 2013

A filosofia de São Tomás de Aquino nos prólogos dos comentários a Aristóteles.

“‘Façamos o homem a nossa imagem e semelhança‘: Como todo agente produz algo semelhante a si mesmo enquanto agente, se cada um age segundo sua forma, é necessário que no efeito haja uma semelhança com a forma do agente.” São Tomás de Aquino

Publicamos hoje um trabalho que, embora de caráter acadêmico, e, portanto fora de nosso escopo habitual, trata de alguns princípios importantes referentes às relações entre Fé e razão dentro da filosofia de São Tomás de Aquimo. O trabalho foi originalmente publicado na revista Agora, da Universidade Católica de Pernanmbuco, no. 2, jul-dez 2011, por nossa colaboradora Ivone Fedeli.

A filosofia de São Tomás de Aquino nos prólogos dos comentários a Aristóteles

                                                           Profa. Dra. Ivone Fedeli

FALSAFA – Grupo de Pesquisa de Filosofia Medieval

Latina e de Filosofia Medieval em Árabe
Pontifícia Universidade Católica – Santo Paulo – PUC-SP

Resumo

Incluída numa pesquisa, ainda incipiente, sobre a recepção e aproveitamento por parte de São Tomás de Aquino, ao estudar as questões sobre o Verbo, das teorias de Aristóteles sobre a linguagem, esta comunicação trata da importância dos prólogos aos comentários sobre as obras principais de Aristóteles como a fonte mais sistematizada dos princípios filosóficos utilizados pelo Dominicano nessa tarefa, uma vez que neles se condensa o pensamento filosófico mais pessoal do Aquinata.
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Abstract

This communication, which is included in a research about the reception and utilization by Saint Thomas Aquinas, when he studies the questions about the Verb, of Aristotle’s theories on language, is about the importance of the commentaries of Aristotle’s prorogues, by Aquinas, as the better and the most systematized source used in this task by the Dominican, because these condense the most personal philosophical thought of Aquinas.
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Esta comunicação insere-se no contexto de uma pesquisa sobre a recepção e aproveitamento, por parte de São Tomás de Aquino, das teorias sobre a linguagem de Aristóteles, ao estudar as questões sobre o Verbo.

Trabalho, portanto, ligado à história da filosofia, mas não apenas, uma vez que tanto a possibilidade quanto a modalidade dessa recepção, dentro do próprio sistema em que ocorrem, levantam algumas questões importantes que, ultrapassando o aspecto histórico, tocam o cerne da filosofia e mesmo da teologia tomistas.

Mais ainda, alcançam alguns dos mais atuais temas filosóficos, já que a Filosofia da Linguagem está no centro das reflexões da filosofia contemporânea, transformando-se, para alguns, aliás, no único objeto filosófico possível.[1]

Ainda que, segundo Marconi, em matéria de filosofia da linguagem,

Tem-se a impressão de que referência a tal ou tal dos clássicos serve principalmente para enobrecer posições contemporâneas – dotando-as de uma tradição – e que os nomes desses filósofos do passado funcionam como códigos de teses atemporais, enquanto o contexto de pensamento nos quais essas teses foram elaboradas não tem nenhuma importância.

E que
Diferentemente do que pode ocorrer em outros setores da filosofia contemporânea, como a ética ou a estética, os filósofos clássicos, desde Aristóteles até Nietzsche, aparecem na filosofia como outras Estátuas do Comandante, ou absolutamente não aparecem.[2]



Não há, porém, porque ignorar, sob pena de cairmos numa espécie de fundamentalismo da modernidade – fora da qual, não haveria salvação –, a reflexão sobre o tema de autores que, como Aristóteles e São Tomás de Aquino, participam dos alicerces da cultura ocidental e, nesse sentido, ainda que como contraponto[3], dos fundamentos da modernidade, não sendo possível, portanto, ter uma apreciação adequada da contemporaneidade ignorando-se, preconceituosa e simplesmente, seus pontos de partida.

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Ao tratar da conceituação de Verbo apresentada por São Tomás, Lonergan observa que ela é de uma elaboração extremamente complexa, pois intenta não apenas “adaptar uma criação agostiniana original[4] num quadro aristotélico”, mas ainda “embora de longe e implicitamente, de combinar uma fenomenologia do sujeito com uma psicologia da alma”.

Problemas complexos, sem dúvida. Contudo, há dois problemas prévios a esses, que os abrangem: o primeiro é a questão da utilização da filosofia – aristotélica, no caso – para explicação do texto evangélico, explicitado por Paissac:

Poder-se-ia, com efeito, censurar às especulações sobre o Verbo por alimentar-se demais da filosofia, [...]. Não seria necessário preferir a essas construções racionais sem garantia absoluta a rigorosa exegese do texto evangélico [...]? São Tomás não fez mal de misturar às puras luzes da fé explicações complicadas demasiadamente próximas do aristotelismo?[5]



Deixando de lado o aspecto puramente religioso da questão – fora de nosso escopo – a questão que se põe é a da possibilidade da aplicação de um sistema filosófico a questões que o transcendem, encontrando-se fora do âmbito propriamente filosófico. Ou seja, em que medida e de que modo o pensamento filosófico pode ser válida e coerentemente, aplicado a um campo que lhe é externo.

Questão essa que pode ser analisada sob um duplo ponto de vista: interna ou externamente ao sistema tomista.

Como não é nosso objetivo estendermo-nos sobre esse ponto neste momento, gostaríamos de dar algumas pistas através da quais, dentro do sistema do Aquinata, esse problema pode ser resolvido.

Um primeiro aspecto que é preciso lembrar, por ser absolutamente fundamental, é que, usando as palavras de Chesterton: “a própria vida do ensinamento tomista era que a Razão merece confiança”[6]. Essa é a base do edifício filosófico tomasiano e, naturalmente, está na base da possibilidade da aplicação de uma doutrina sobre a linguagem humana ao processo de geração da palavra divina, que envolve as questões sobre o Verbo.

É só porque podemos ter confiança na razão e, portanto, na apreensão que ela faz da realidade, nos juízos que elabora a partir dessa apreensão e também nas conclusões que decorrem desses primeiros juízos, que podemos aplicar tais conclusões à compreensão de realidades não acessíveis aos sentidos e nem sequer à razão natural.

Essa confiabilidade da razão, contudo, se é necessária não é suficiente para que possamos supor a possibilidade do aproveitamento da filosofia aristotélica da linguagem ao estudo das questões sobre o Verbo. A dificuldade vem da infinita distância entre a natureza humana e a natureza divina.

Pois, como menciona São Tomás ao elencar as teses contrárias àquela que afirmará, logo nas primeiras questões da Suma Teológica, ao tratar da possibilidade de se conhecer existência de Deus através de suas criaturas,  “Ele é infinito e seus efeitos [o homem e sua linguagem, inclusive] são finitos; e entre o finito e o infinito não há proporção.”[7]

A resposta de São Tomás a essa objeção, no que tange à possibilidade de demonstração da existência de Deus, só parece confirmar a impossibilidade da aplicação de qualquer categoria humana para o conhecimento dos processos divinos. Diz ele: “Por meio de efeitos desproporcionais à causa [non proportionalis causae], não se pode obter desta causa um conhecimento perfeito.”[8]

Mais ainda, ao estudar a simplicidade divina, o autor concede que, de Deus, embora possamos saber, através de seus efeitos, que existe “Non autem possumus scire quid sit”, “não podemos saber o quê Ele é”[9]

Assim, poderíamos pensar que, segundo o próprio São Tomás, seria impossível aplicar qualquer categoria de conhecimento do criado, e, portanto, do humano, para obter um conhecimento adequado da divindade, que nos seria completamente desconhecida.

Contudo, tal não é o que acontece. E um começo da elaboração da doutrina que permite essa aplicação, que possibilitará a analogia entre o pensamento e a palavra humana à doutrina teológica da processão do Verbo Divino, ou seja, da aplicação de Aristóteles à Sagrada Escritura, elaborando uma nova filosofia para um aprofundamento da teologia, aparece já no terceiro artigo da quarta questão da Suma Teológica.

Nessa questão, São Tomás se pergunta se “alguma criatura pode ser semelhante a Deus”; não é preciso sublinhar como a questão é importante para nossa investigação, uma vez que nas questões sobre o Verbo se trata, propriamente, de aplicar categorias que na filosofia de Aristóteles aparecem como referentes à linguagem humana, ao conhecimento da Palavra Divina, o Verbo.

E depois de ter, na forma característica, mostrado como “parece” que qualquer similitude entre Deus e a criatura, e, portanto, entre os processos humanos e os processos divinos, é impossível, ele contradiz – sed contra – essa doutrina com a autoridade da Sagrada Escritura, citando dois textos, um do Novo e um do Antigo testamento: “Mas, em contrário, está escrito: “Façamos o homem a nossa imagem e semelhança” (Gn 1, 26) e “Quando Ele aparecer seremos semelhantes a Ele” (I Jo 3, 2)”.

É na resposta dessa questão que encontraremos os princípios que serão plenamente desenvolvidos nas doutrinas da analogia e da participação, essenciais para a compreensão deste problema, mas que não é possível estudar aqui. Diz ela:

Como todo agente produz algo semelhante a si mesmo enquanto agente, se cada um age segundo sua forma, é necessário que no efeito haja uma semelhança com a forma do agente.[10]



Embora simples, é nessa doutrina da semelhança entre as formas do agente e do efeito – de Deus e do homem – que se apoiará, em última instância, a aplicação de categorias humanas aos processos divinos.



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Um segundo problema prévio é o do próprio sistema filosófico que o Aquinata utilizará para elaborar sua teoria ou, dito de modo mais geral, a questão da sistematização de uma filosofia propriamente tomasiana para a execução dessa tarefa, uma vez que, por um lado, São Tomás não escreveu tratados de filosofia e, mais ainda, jamais pretendeu sequer ser um filósofo, mas somente um teólogo, ainda que não usasse para si mesmo essa designação, rara no tempo, sendo o título comum o de Mestre de Sagrada Escritura, Magister in Sacra Scripiturae, usado pelo próprio doutor em sua famosa aula inaugural, ou Magister in Sacra Pagina. [11]

Não sendo filósofo, não teria, portanto, uma filosofia própria. Se pensarmos, porém, em São Tomás como um simples aplicador da filosofia aristotélica, a questão que nos ocupa deparar-se-á com uma grande dificuldade, uma vez que a questão do Verbo Divino, expressa no Evangelho de Santo João sob o termo grego de Logos (λóγος) e sistematizada na teologia católica principalmente, embora não exclusivamente, por Santo Agostinho, sobretudo no De Trinitate, é completamente alheia a Aristóteles.

Por isso é importante analisar a relação de São Tomás com o filósofo de Estagira – para o Aquinata simplesmente “o Filósofo” –, cuja obra filosófica ele se dedicou a comentar. E daí a importância de partirmos da investigação do que é e como se elabora uma filosofia menos aristotélica e mais tomista e, para isso, os Comentários a Aristóteles, escritos por Frei Tomás nos seus últimos seis anos de vida, são fundamentais.



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Como se sabe, grande parte da literatura escolástica medieval é constituída pelos comentários[12], uma vez que a leitura comentada, e de obras obrigatórias, escolhidas pela corporação universitária e não pelo professor, era uma parte importantíssima do ensino universitário.

Havia muitos tipos de comentários, mas do século XIII são típicos os comentários que constam de duas partes: a expositio, explicação literal do texto, com o objetivo de torná-lo claro aos estudantes, quer se tratasse de um texto da Sagrada Escritura, quer de um texto de filosofia, e as quaestiones, discussão dos problemas doutrinários levantados pelo texto. Na segunda metade do século XIII essas duas partes se separam e surgem os comentários contínuos, chamados sententiae e os comentários em forma de questões.

Assim, o importante é compreender que os Comentários medievais – e os comentários de São Tomás de Aquino, em particular, que são nosso foco de interesse – estão longe de ser uma simples paráfrase: eles explicam o texto, mas também dialogam com ele, sem sentir-se obrigados a um seguimento servil do pensamento do autor.

Como afirma Ribeiro do Nascimento,



“um comentário medieval está longe de ser uma exposição puramente histórica do texto comentado. Ele combina níveis distintos de leitura, procurando simultaneamente explicar um autor e pensar junto com ele.”[13]



Torrel, por sua vez, faz notar que vários autores



[...] não deixaram de apontar que Tomás não se priva em absoluto de exprimir seu ponto de vista pessoal, retificando e amplificando Aristóteles quando considera necessário; de modo que podemos nos basear nesses comentários para reconstituir do pensamento do Aquinata.[14]



O mesmo autor comenta ainda que



Quanto à fidelidade aristotélica dessa exegese, os historiadores foram se tornando cada vez mais críticos. Reconhece-se que é inteligente e sem dúvida profunda, muitas vezes literal, mas não deixou de desvirtuar a doutrina de Aristóteles em pontos decisivos, como no comentário sobre a Ética, guiado pelo princípio explicitamente cristão da visão beatífica, ou naquele sobre a Metafísica, orientado no sentido de uma metafísica do ser que lhe era estranha.[15]



Para concluir, o que é importante em nosso caso, que a “reconstituição historicamente exata do pensamento de Aristóteles não o [a São Tomás] interessa em si mesma”, pois, segundo as regras da expositio reverentialis da hermenêutica medieval



[...] cujo objetivo é encontrar o que o autor ‘quer dizer’, no sentido de que “para compreender Aristóteles, é preciso esforçar-se por encontrar o movimento global de seu pensamento e recordar a verdade em busca da qual ele partiu, e que procurava bem ou mal exprimir. Nesse ponto preciso, Tomás sente-se autorizado a pôr-se em seu lugar e fazê-lo dizer coisas em que ele nem sequer poderia ter pensado.



Como expressa Échivard, ao comentar justamente os proêmios de São Tomás a Aristóteles,



De fato, a intenção de São Tomás nestes comentários não poderia ser reduzida à ordem puramente histórica. Ao escrutar “o que pensaram os homens”, na ocorrência os textos de Aristóteles, São Tomás pretende alcançar a veritas rerum cf. In De caelo, I, lect. 22, 8), ainda que para isso seja necessário ultrapassar a letra para melhor desenvolver a intentio auctoris, ou seja, não as intenções subjetivas explícitas de Aristóteles, mas a lógica objetiva implícita de seus princípios doutrinais. [16]



É necessário compreender essa liberdade, digamos assim, do autor medieval, em geral, e de São Tomás de Aquino, em particular, para compreender a importância dos comentários a Aristóteles na elaboração da filosofia de São Tomás. Não é essa uma tarefa fácil, pois, como afirma Geiger,



Resta muito a fazer para a exploração sistemática dos comentários, pela distinção notadamente entre as passagens destinadas a fixar, tão objetivamente quanto possível, o sentido do texto ou a intenção do autor, e aquelas que contêm o pensamento pessoal do comentador; estas últimas são quase sempre reconhecidas pelas fórmulas de introdução, tais como – “Et hujus ratio est…” ou ainda “Ad hoc considerandum est.”.[17]

Não é, portanto, um trabalho fácil, mas é um trabalho necessário para entrar em contato com a elaboração mais sistemática da filosofia tomasiana. Além disso, ao redigir seus comentários, ele elaborou, segundo o costume da época, para cada um deles, um preâmbulo no qual apresenta a intenção geral do tratado em foco e o situa na disciplina filosófica à qual pertence, tratando também das partes em que está dividido.

Assim, é ao comentar a filosofia aristotélica que o Aquinata vai elaborar de modo mais sistemático o seu pensamento filosófico e é nos prólogos a seus próprios comentários que, com maior liberdade, porque menos preso ao texto, postula os princípios fundamentais dessa filosofia.

Os comentários de São Tomás às principais obras de Aristóteles ocorrem no momento de sua plena maturidade intelectual. Embora, segundo Tocco, ele tenha estudado a obra de Aristóteles desde sua primeira formação universitária em Nápolis, chegando, segundo Grabmann, a transcrever uma cópia ou extrato de uma das obras de Aristóteles sobre lógica, já por volta dos dezenove anos, no período de seu aprisionamento pela família, para evitar que ele se tornasse dominicano[18], é somente a partir de 1267, quando já tem por volta de quarenta e dois anos, que ele, começando com o Sententia Libri de Anima, vai se dedicar a comentar a obra principal de Aristóteles, até sua morte aos quarenta e nove anos.

Sem pretender tomar partido em questões de minúcia cronológica, que não são importantes para nosso trabalho, apresentamos abaixo uma lista desses comentários com a data de sua elaboração:
1267-1268 -     Sententia libri De anima até o livro III
1268-1269 -     Sententia libri De sensos et sensatus
1268-1270 -     Sententia super Physicam
1269-1271 -     Sententia super Meteora
1270-1271 -     Expositio libri Peryermeneias
1271-1272 -     Sententia libri Ethicorum
c. 1272      -     Sententia libri Politicorum
1271-1273 -     Sententia super Methaphysicam
1271-1272 -     Expositio libri Posteriorum
1272-1273 -     Sententia super librum De caelo et mundo
1272-1273 -     Sententia super libros De generatione et corruptione 



É, como se pode notar, um trabalho enorme, realizado em brevíssimo tempo.

Qual a razão desse trabalho tardio e tão intenso, elaborado em meio a constantes mudanças de lugar e de tarefas, lembrando que não se trata da preparação de cursos para serem ministrados aos estudantes, embora realizados num período de constante labor pedagógico e também da redação da Suma Teológica?

Muitas hipóteses são levantadas a esse respeito e, talvez, todas elas tenham uma parte da verdade.

Torrel, por exemplo, vê em alguns deles um objetivo de estudo pessoal, uma sistematização filosófica particular, com o intuito de fundamentar melhor, do ponto de vista filosófico, seus trabalhos teológicos:



Compreenderemos melhor o intento de Tomás se recordarmos que seus comentários não eram cursos que teria ministrado a estudantes. Eram antes o equivalente a uma leitura pessoal devidamente anotada como forma de condicionar-se a uma incisiva penetração do texto de Aristóteles a título de preparação para a redação da parte moral da Suma Teológica. Ele já utilizara esse procedimento com a Sentencia libri De anima.[19]



Outros, porém, como Weisheipl, pensam que se trata de uma sistematização filosófica, feita, embora não para cursos diretos, na intenção dos frades dominicanos estudantes de artes, a fim de proporcionar-lhes uma melhor compreensão dos textos aristotélicos, julgando igualmente que esses comentários têm um grande valor filosófico e desempenharam importante papel no desenvolvimento da teologia de Tomás.”[20]

Por fim, há ainda aqueles que, com Chenu, veem nesses comentários obras preparatórias à polêmica com os averroístas:

É no clímax da crise averroísta – desde o incidente de 1256 (De Unitate intellectus de Alberto) até às condenações de 1270 e 1277 (Siger de Brabant) – que se inscreve o ensino de são Tomás sobre os livros de Aristóteles. É claro que esses contextos comandam sua intenção; e essa intenção, por sua vez, comanda, em seu conjunto, como nos detalhes, a exegese de seus comentários.[21]



O que é importante notar, como conclusão desta breve comunicação de pesquisa, é que, apesar das divergências sobre o objetivo primeiro dos comentários, todos concordam em reconhecer sua importância enquanto sistematização filosófica no conjunto da obra do Aquinata. É sob este ponto de vista que pretendemos estudá-los em outros trabalhos, como primeiro passo ao estudo de como o sistema filosófico assim codificado, com suas assimilações e suas extrapolações quanto à filosofia aristotélica, foi aplicado ao estudo das questões sobre o Verbo.



Bibliografia



CHENU, M. D. Introduction à l’étude de Saint Thomas. D’aquin. Paris: J. Vrin, 1954.

CHESTERTON, G. K. St. Thomas Aquinas. San Rafael: Angelico Press, 2011.

ÉCHIVARD, J.-B. Une introduction à la philosophie. Les proèmes des lectures de saint Thomas d’Aquin aus oeuvres principales d’Aristote. Paris: François Xavier Guibert, 2004 a 2008 , 5 volumes.

________________ Frère Thomas d’Aquin, philosophe? Paris: Parole et Silence Editions, 2011.

GADAMER, Hans-Geor. Vérité et méthode. Paris: Seuil, 1996

LONERGAN, Bernard. La notion de Verbe dans les écrits de Saint Thomas d’Aquin. Paris: Beauchesne, 1967.



MARCONI, Diego. La philosophie du langage au XXe.siècle. Paris: Éclat, 1997

MURALT, André de. A Metafísica do Fenômeno. Santo Paulo: Editora 34, 1998.

PAISSAC, H. Théologie du Verbe – Saint Augustin et Saint Thomas. Paris: Cerf, 1941.



PIPPER, Josef. Guide to Thomas Aquinas. Santo Francisco: Ignatius Press, 1991.



RIBEIRO DO NASCIMENTOS, C. A. São Tomás, comentador de Aritóteles. http://coloquiolusobrasileiro.blogspot.com.br/2008/06/santo-toms-comentador-de-aristteles.html 27.04.2012.



TOMÁS DE AQUINO. Opera omnia / Sancti Thomae de Aquino; ed. iussu Leonis XIII P. M.  Roma/ Paris: Commissio Leonina/ Librairie Philosophique J. Vrin/ Centre National de la REcherche Scientifique, 1989.

__________________ Suma Teológica. Santo Paulo: Paulus, 2009.



TORREL, Jean-Pierre. Iniciação a Santo Tomás de Aquino. Santo Paulo: Martins Fontes, 199.

__________________ Thomas d’Aquin, maître spirituel. Paris/Friburgo: Cerf/ Èditions Universitaires de Fribourg, 1996.

[1] Cfr. GADAMER, Hans-Geor. Vérité et méthode. Paris: Seuil, 1996. p. 405 e ss, por exemplo. “O ser que pode ser compreendido é a linguagem”; e ainda “a linguagem e a compreensão são caracteres que definem em geral e fundamentalmente toda relação do homem com o mundo”, apud MARCONI, Diego. La philosophie du langage au XXe.siècle. Paris: Éclat, 1997. p. 2. NB: todas as traduções para o português, salvo menção em contrário, são da autora.

[2] MARCONI, Diego. La philosophie du langage au XXème.siècle. Paris: Éclat, 1997. p. 3.

[3] Cfr. MURALT, André de. “A doutrina medieval das distinções e a inteligibilidade da filosofia moderna” in A Metafísica do Fenômeno. São Paulo: Editora 34, 1998, p. 190 e ss.

[4] Sem dúvida, a expressão de Lonergan tem aqui um sentido especial, que não pode ser absolutamente restritivo, pois, de um lado, a terminologia do Verbo (λóγος) é inaugurada por São João (cfr. Jo 1, 1) e, de outro, no seu seguimento muitos autores, além de Santo Agostinho, a utilizaram, e desenvolveram, como, por exemplo, São Cirilo e Santo Atanásio, autores, nos quais, aliás, São Tomás bebeu largamente. Cfr. TORREL, Jean-Pierre. Saint Thomas d’Aquin, maître spirituel. p. 170.

[5] PAISSAC, H. Théologie du Verbe – Saint Augustin et Saint Thomas, p. 6.

[6] CHESTERTON, G. K. St. Thomas Aquinas. San Rafael: Angelico Press, 2011.

[7] ST I, Q 2, a 2. As traduções para o português da Suma Teológica são da edição brasileira da Paulus, 3ª. edição, 2009.

[8] Idem, ibidem, resposta à 3ª. Objeção.

[9] ST I, q 3. a. 4.

[10] ST I Q. 4 a. 3.

[11] Cfr. TORREL.  “Magister in Sacra Pagina” in Iniciação a Santo Tomás de Aquino. São Paulo: Loyola, 1999, p. 66. Sobre o problema, ver também ECHIVARD, Jean-Baptiste. Frère Thomas d’Aquin, philosophe? Paris: Parole et Silence Editions, 2011.

[12] Cfr. RIBEIRO DO NASCIMENTOS, C. A. São Tomás, comentador de Aritóteles. http://coloquiolusobrasileiro.blogspot.com.br/2008/06/santo-toms-comentador-de-aristteles.html 27.04.2012.

[13] Idem, ibidem.

[14] TORREL, Jean-Pierre. Iniciação a Santo Tomás de Aquino. P. 276.

[15] Idem, ibidem, p. 277

[16] ÉCHIVARD, J.-B. Une introduction à la philosophie. v. 1, p. 11.

[17] “Saint Thomas et la métaphysique d’Aristote”, em Aristote et Saint Thomas d’Aquin (Journées d’Études Internationales. Chaire Cardinal Mercier, 1955). Louvain: Publ. Univ. De Louvain, Paris: Béatrice Nauwelaerts, 1957, p. 177; retomado em Philosophie et Spiritualité. Paris: Cerf, 1963, vol. I, p. 127. Apud RIBEIRO DO NASCIMENTO, op. cit. p. 2.

[18] GRABMANN, Martin. Mittelalterliches Geitesleben. Munique, 1926. Apud PIPPER, Josef. Guide to Thomas Aquina. São Francisco: Ignatius Press, 1991.

[19] TORREL, Jean-Pierre. Iniciação a São Tomás de Aquino. P. 266.

[20] WEISHEIPL, J. A.  Frère Thomas d’Aquin, Paris: Cerf, 1993, p. 350, apud ÉCHIVARD, Jean-Baptiste. Frère Thomas d’Aquin, philosophe? p. 10.

[21] CHENU, M. D. Introduction à l’étude de Saint Thomas, p. 176.

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