quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Se é proibido evocar os espíritos, por que os santos têm visões?

Se é proibido evocar os espíritos, por que os santos têm visões ?

Bem diferentes dos fenômenos espíritas são as visões que os santos têm.

Estas são totalmente gratuitas, não resultando de ritos prèviamente executados para as provocar. Não há dúvida, tais visões podem ser a resposta do Senhor a preces justas desejosas de obter um sinal sobrenatural. Contudo, assim como o Senhor Deus pode atender a essas orações (caso isso concorra para o bem dos fiéis), pode também não as deferir; nunca será lícito ao cristão crer que dispõe de meio seguro para se comunicar com as almas dos defuntos ; todo o nosso intercâmbio com eles se realiza mediante insondável e soberana permissão de Deus. Mesmo quando uma pessoa devota julga estar sendo agraciada por visões, os mestres da vida espiritual aconselham-lhe toda a cautela na interpretação de tais fenômenos, pois Satanás não raro se dissimula em “anjo de luz” !(Cf 2 Cor 11,14). As autênticas aparições de santos ou almas neste mundo (mesmo não provocadas) não são tão frequentes quanto propalam as notícias !

Como se vê, este ponto de vista não se identifica com a posição dos espíritas, que afirmam poder entrar em contato com tal alma, por ocasião de tais ritos... Procedem como se ainda tivessem jurisdição ou poder sobre aqueles que não são mais da nossa convivência e cuja sorte só Deus conhece.

Para o católico, ainda é importante o testemunho da Sagrada Escritura. O mesmo Deus que, segundo seus inescrutáveis desígnios, permite às vezes a aparição de santos ou defuntos, proibiu terminantemente a evocação dos mortos:

“Se alguém se dirigir aos que evocam os espíritos e aos adivinhos, para se entregar às suas práticas, voltarei minha face contra esse homem e o afastarei do meu povo” (Lev 20,6).

“Todo homem ou toda mulher que evocar os espíritos ou se der à adivinhação, será punido de morte; lapidá-lo-ão; seu sangue recairá sobre ele” (Lev 20,27).

Não obstante estas proibições, sabe-se que o rei Saul, atribulado numa campanha bélica, foi ter com a pitonisa (ou adivinha) de Endor, pedindo-lhe que o pusesse em comunicação com a alma de Samuel, seu guia de outrora (cf. 1 Sam 28,7-14). O cronista bíblico acentua bem que esse feito foi ilícito: “Saul... se tornara culpado diante do Senhor... porque interrogara e consultara os que evocam os mortos” (1 Crôn. 10,13). Não obstante, Deus se dignou permitir que o espírito de Samuel evocado respondesse: permitiu-o, não por causa dos ritos da pitonisa, que eram totalmente ineptos para tanto, mas tomando como mera ocasião a visita do rei à adivinha. O motivo por que então o Senhor atendeu a Saul foi, como se depreende das palavras de Samuel, o desejo de admoestar o rei à penitência, ao menos no fim de sua vida; a exortação dirigida a Saul em circunstâncias tão extraordinárias seria particularmente eficaz. Disto, porém, não se segue que Deus se dirija aos homens por via tão estranha todas as vezes que estes o desejem, para satisfazer ao capricho das criaturas.


Dom Estêvão Bettencourt (OSB)

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