Diálogo ecumênico:
RELIGIÃO SALVA?
Em síntese: A Religião, entendida como
instituição, não salva. Só Jesus Cristo, segundo o protestantismo, salva...
Salva, porém, (dizem os católicos) mediante seu Corpo Místico que é a
Igreja-instituição. A Religião, que consiste em aderir à Igreja, vem a ser o
sacramento pelo qual passa a salvação que vem de Cristo. A instituição, que
goza da assistência de Cristo, resguarda os fiéis contra o subjetivismo, que
tende a destruir a mensagem
revelada. Está claro, porém, que a fé será sempre o princípio dinamizador da
vida do cristão na Igreja.
* * *
No diálogo ecumênico os
interlocutores protestantes colocam a pergunta "Religião salva?", pergunta
à qual dão resposta negativa. Esta atitude merece consideração.
1. O problema
Eis a mensagem enviada a PR via
internet:
"As palavras de Tiago,
irmão do Senhor, líder espiritual da Igreja primitiva em Jerusalém, martirizado
pelos judeus no ano 62, nos ensinam o que é religião:
A religião pura e sem mácula,
para com o nosso Deus e Pai é esta: ‘visitar os órfãos e as viúvas nas suas
tribulações e a si mesmo guardar-se não contaminado do mundo' (Tg 1, 27).
Vemos, então, que o coração da
verdadeira religião não se manifesta na institucionalização de dogmas, credos
ou ritos, mas na prática cotidiana do amor, porque Deus é amor e a sua lei é o amor. Como ensinou
Jesus Cristo, nosso Salvador, a lei de Deus se resume a:
Religião, portanto, é algo pessoal,
algo que se desenvolve em duas dimensões: uma dimensão humana, terrena, na qual
movidos por amor ao próximo e compaixão pelos necessitados, nós os auxiliamos
em suas 'tribulações' (na sociedade judaica da época, por exemplo, os órfãos e
viúvas eram os necessitados); a outra dimensão é a espiritual, em que nos
relacionamos diretamente com o Deus e Pai, guardando-nos daquilo que este mundo
tem a nos oferecer e que pode levar à corrupção do caráter e contaminação da
alma. Coisas, enfim, que nos macularão e nos afastarão de Deus.
'Amarás o Senhor teu Deus, de
todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu
entendimento; e amarás o teu próximo como a ti mesmo' (Lc 10, 27).
Porque Deus é único, e cada um de
nós somos seres únicos, o que Ele espera de nós é que, por meio de Jesus Cristo,
a cada dia vivamos esta religião pura e sem mácula".
Dizem outros: a Religião é um conjunto
de crenças, leis e práticas codificadas, aptas a atrofiar a fé, suscitando a impressão
de que a pessoa religiosa pode obter efeitos mágicos.
Em nossos dias é o
protestantismo neopentecostal que professa tais idéias, tendo em vista esvaziar
os conceitos de Igreja e magistério da Igreja em favor da tese do livre exame
da Bíblia: a cada crente se confere o direito de configurar o Cristianismo a
seu modo, já que "Religião-lgreja" não salva.
Perguntamos:
2. Que dizer?
Proporemos seis observações a
respeito:
1) Sem dúvida, a fé é o dínamo da
vida espiritual; é a fonte de toda prática religiosa. Cf. Rm 1,17: "o
justo vive da fé".
2)
O
princípio "Somente a fé" acarreta o risco do subjetivismo religioso
alimentado pela prática do livre exame da Bíblia; assim vai-se dilacerando cada
vez mais o patrimônio da fé ou da Revelação Divina, como acontece nas
comunidades dos Mórmons e das Testemunhas de Jeová.
3)
Para
conter o subjetivismo esvaziador, faz-se necessária uma instância objetiva, que
paire acima dos subjetivismos ou dos "achismos (eu acho que...)" que
é a Igreja com seu magistério assistido pelo Espírito Santo; cf. Jo 14, 25s. A
Igreja é Mãe e Mestra, que tem a promessa da infalibilidade em matéria de fé e
de Moral.
4)
Mais:
o Cristianismo não é simplesmente uma escola, na qual o mestre dá as suas aulas
e vai embora. Cristo não é somente um Mestre martirizado; é um tronco de videira,
da qual nós somos os ramos (cf. Jo 15,1-5); é Cabeça de um Corpo, do qual somos
os membros cf. 1Cor 12, 12-20. Ele continua vivo e atuante na Terra mediante os
sacramentos: o Sacramento da Igreja, que prolonga o Sacramento da Encarnação e
que se estende a cada cristão através dos sete sacramentos da Liturgia. Em
outros termos: Deus se dá aos homens não de maneira meramente privada e
individualista, mas mediante sinais, que são a humanidade de Jesus, o Corpo de
Cristo que é a Igreja, e os sete sinais sacramentais (água, pão, vinho, gestos,
palavras), que perfazem o que se chama uma instituição. Esta é indispensável
para que haja ordem numa sociedade.
5)
Está
claro que somente Jesus Cristo salva, mas Ele quer salvar mediante a Igreja, da
qual Ele é Cabeça, Igreja que professa o seu Credo, tem seu Código de Moral e
seus ritos sagrados... Este conjunto institucional não sufoca a fé, mas a
preserva contra o subjetivismo deteriorante.
6)
Para
preencher seu papel de instrumento da salvação, a Religião ou a religiosidade
do cristão há de ser esclarecida e consolidada mediante a leitura e o estudo, preservando-a
de cair na superstição e no sincretismo. Cada fiel católico saberá avaliar as
modalidades de aprofundamento da fé de que precisa.
Eis em que termos se pode dizer
que, se a Religião não salva, Ela é ao menos indispensável instrumento de salvação.
Dom Estêvão Bettencourt
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