Com a experiência de consultor da Sagrada Congregação para o Clero, Padre Paulo Ricardo, em uma entrevista, expõe sua visão sobre realidades da Igreja no Brasil:
REPORTER: O senhor disse em pregação do dia 25 de janeiro, na Canção Nova, que se converteu após cinco anos de sacerdócio. Como pode alguém já ser padre e não ter tido uma experiência pessoal com Jesus?
Padre Paulo Ricardo: O que eu quis afirmar nessa Santa Missa é que aquela foi a conversão mais forte que aconteceu na minha vida. Eu conheço a Renovação Carismática Católica desde que eu era adolescente e vivia nos Estados Unidos, em 1983. Depois, vim para o Brasil com o “gás” todo, batizado no Espírito Santo, rezando em línguas. Entrei para o seminário, mas como a vida é feita de progressos e regressos, lá dentro, eu senti que as coisas de Deus foram tomando o lugar de Deus.
Às vezes, nós usamos “as coisas de Deus” e nos esquecemos do “Deus das coisas”, pegamos aqueles presentes que Ele nos dá e os transformamos em ídolos. Para mim, o sacerdócio, o meu ministério e as coisas da Igreja foram se transformando em ídolos naquela época. Foi somente em 1997, que, visitado pelo sofrimento, eu descobri a grandeza da cruz na minha vida.
Às vezes, nós usamos “as coisas de Deus” e nos esquecemos do “Deus das coisas”, pegamos aqueles presentes que Ele nos dá e os transformamos em ídolos. Para mim, o sacerdócio, o meu ministério e as coisas da Igreja foram se transformando em ídolos naquela época. Foi somente em 1997, que, visitado pelo sofrimento, eu descobri a grandeza da cruz na minha vida.
REPORTER: Quais sofrimentos foram estes?
Padre Paulo Ricardo: Eu passei por uma série de calúnias na minha vida como sacerdote, perdas afetivas de pessoas, seminaristas que eu achava que iriam se tornar padres e não se tornaram. Tive várias frustrações. Um “belo” dia, 31 de janeiro de 1997, dia de São João Bosco, Deus me visitou na oração, dizendo-me que eu deveria esperar, porque aquele sofrimento não tinha sentido para mim, mas para Jesus sim.
Quando eu descobri a ressurreição, que está atrás da cruz, aconteceu a minha maior conversão e ressurreição também. A partir daí, eu comecei, verdadeiramente, a ser um sacerdote. Eu já era padre, mas ser sacerdote é ser como Cristo, é oferecer-se imolado na cruz.
Quando eu descobri a ressurreição, que está atrás da cruz, aconteceu a minha maior conversão e ressurreição também. A partir daí, eu comecei, verdadeiramente, a ser um sacerdote. Eu já era padre, mas ser sacerdote é ser como Cristo, é oferecer-se imolado na cruz.
REPORTER: O que os seminaristas podem fazer para se orientarem e não permitirem que isso aconteça com eles?
Padre Paulo Ricardo: A primeira coisa é saber que nada substitui a nossa experiência com Deus e que eles devem purificar as suas intenções. Costumo dizer que a razão pela qual o seminarista entra no seminário, não é a razão pela qual ele permanece lá. Muitas vezes, entramos por razões equivocadas, seja para fazer uma carreira, porque achamos o ato eclesiástico bonito, queremos ser importantes ou porque temos alguma vaidade. Mas Deus é muito esperto, e nos chama assim mesmo.
Como diz o profeta Oséias: “Deus nos atrai com laços humanos”. Depois, Ele acaba com esses laços, mas, então, já estamos na “armadilha” d’Ele. Por isso, é importante que o seminarista saiba voltar-se cada vez mais para o Senhor. Mas para que isso aconteça, ele precisa ter clareza, identidade sacerdotal, porque um sacerdote não é apenas um homem, é um sacrifício.
Como diz o profeta Oséias: “Deus nos atrai com laços humanos”. Depois, Ele acaba com esses laços, mas, então, já estamos na “armadilha” d’Ele. Por isso, é importante que o seminarista saiba voltar-se cada vez mais para o Senhor. Mas para que isso aconteça, ele precisa ter clareza, identidade sacerdotal, porque um sacerdote não é apenas um homem, é um sacrifício.
REPORTER: Em seu site, o senhor afirma que a Igreja Católica no Brasil sofre de “AIDS Espiritual”. Por quê?
Padre Paulo Ricardo: Para entendermos a “AIDS espiritual”, precisamos entender a AIDS física. Ela é uma deficiência que torna o corpo incapaz de “soar o alarme” e dizer que tem algum elemento agressor em nosso corpo, o qual está nos fazendo mal. O sistema imunológico trata o vírus como amigo, e “chama” aquilo que lhe faz mal de amigo.
A Igreja no Brasil está doente por causa de uma mania chamada “politicamente correto”, ou seja, nós não queremos chamar o mal de mal. Por exemplo, nós já não queremos dizer que o homossexualismo é algo que precisa ser curado porque isso não é “politicamente correto”. Todo mundo fica com medo de ser processado pelo “movimento gay”; e isso intimida a todos.
Nós vivemos numa época em que os maus têm uma arrogância, um destemor, mas nós, que estamos lutando para o bem, somos tímidos. Com isso, é claro que a maldade só poderia crescer como uma “AIDS Espiritual”, mas antes de irmos contra ela, precisamos dar-lhe o nome correto, por mais feio que seja, e identificar essas dificuldades.
REPORTER: A AIDS física não tem cura. E a “AIDS espiritual” tem? Como combatê-la?
Padre Paulo Ricardo: Ela tem cura sim, mas é necessário que a pessoa tenha um amor pela verdade maior do que pela harmonia, pela paz. Atualmente, nós não somos amantes da paz como Jesus nos pede: “Bem-aventurados aqueles que promovem a paz”. Ao contrário, nós somos irenistas, ou seja, queremos colocar “panos quentes” em tudo.
É necessário que nosso amor pela verdade seja maior do que pela tranqüilidade. A pessoa que ama a verdade, abraça-a mesmo que ela doa. Jesus disse que a verdade nos libertará, mas Ele não disse que promovê-la seria prazeroso. Quando eu me encontro com a minha verdade de pecador, isto pode ser extremamente doloroso, mas é uma dor que redime, que salva, porque atrás dela há uma ressurreição.
Nós, cristãos, não somos masoquistas, não gostamos de sofrer, mas, às vezes, existe algo mais valioso do que a tranqüilidade que estamos vivendo. Na verdade, isso é uma crise de valores, uma crise axiológica, ou seja, uma crise em que os valores estão fora de lugar, e não são os mesmos de antes. Nós colocamos como supremo valor a nossa tranqüilidade e o nosso bem-estar.
Nós, cristãos, não somos masoquistas, não gostamos de sofrer, mas, às vezes, existe algo mais valioso do que a tranqüilidade que estamos vivendo. Na verdade, isso é uma crise de valores, uma crise axiológica, ou seja, uma crise em que os valores estão fora de lugar, e não são os mesmos de antes. Nós colocamos como supremo valor a nossa tranqüilidade e o nosso bem-estar.
REPORTER: Há erros doutrinários que assolam o Brasil hoje?
Padre Paulo Ricardo: O mais trágico, hoje, na Igreja do Brasil é que nós estamos deixando Jesus de lado. Não que a Igreja Católica em si O esteja deixando de lado, mas existem pessoas e tendências dentro dela que estão fazendo isso. Por exemplo, com essa coisa do “pluralismo religioso”, do “macro-ecumenismo”, Jesus se tornou um grande incômodo. E não sou eu que digo isso, quem diz isso é o Papa Bento XVI num livro, que ele escreveu quando ainda era sacerdote, no final da década de 60, chamado “Introdução ao Cristianismo”. Nesta obra, ele diz que Jesus se tornou um grande incômodo porque, - se querem unir as religiões -, Jesus é aquele que nos divide em cristãos e não-cristãos.
Fica muito mais fácil pregar essa beleza de que Deus é Pai, é maravilhoso e deixar Jesus de lado, com o pretexto de que Ele está nos incomodando e nos dividindo. Eu conheço padres que são capazes de falar horas a respeito de Deus sem pronunciar a palavra Jesus, porque Ele está sendo, aos poucos, inconscientemente, deixado de lado por eles.
Fica muito mais fácil pregar essa beleza de que Deus é Pai, é maravilhoso e deixar Jesus de lado, com o pretexto de que Ele está nos incomodando e nos dividindo. Eu conheço padres que são capazes de falar horas a respeito de Deus sem pronunciar a palavra Jesus, porque Ele está sendo, aos poucos, inconscientemente, deixado de lado por eles.
REPORTER: Então Jesus incomoda mais do que Deus?
Padre Paulo Ricardo: Sim, porque um Deus que não se fez carne é um Deus que eu posso mais facilmente manipular. Mas um Deus que se fez carne, que tem uma história que eu não posso negar, este não dá para eu manipular, por isso Ele incomoda.
Só para se ter uma idéia, existem livros publicados aqui no Brasil com os seguintes títulos: “Jesus, símbolo de Deus”. Pense bem! Quer dizer, para muitos, Jesus não é Deus, Ele é só símbolo de Deus. Outro livro: “A Metáfora do Deus Encarnado”. Para quem não entendeu a palavra metáfora, ela está dizendo que o fato de que Deus se encarnou e se fez homem, é somente uma comparação, é poesia, e que, de fato, Deus não se encarnou. Só a partir dos títulos desses dois livros, você já imagina que tipo de coisa está sendo publicada no Brasil e utilizada em faculdades teológicas “à luz do dia”, sem ninguém dizer nada.
Uma Igreja que não se levanta para absurdos como esses, não é uma Igreja que “sofre de AIDS”? Nós precisamos chamar o mal de mal e a heresia de heresia!
Uma Igreja que não se levanta para absurdos como esses, não é uma Igreja que “sofre de AIDS”? Nós precisamos chamar o mal de mal e a heresia de heresia!
REPORTER: Quais livros o senhor indica a quem deseja se aprofundar nesses assuntos?
Padre Paulo Ricardo: Os livros, de uma forma geral, do professor Felipe Aquino são extraordinários e conhecidos entre nós. Outros, que eu posso citar, são os livros do Santo Padre Bento XVI, e outros dois que, infelizmente, são pouco publicados aqui no Brasil: “A fé em crise” e “O sal da terra”. São entrevistas que fazem uma radiografia da crise da Igreja nos tempos atuais. Eles fazem um diagnóstico preciso e extraordinário daquilo que a Igreja vive atualmente.
Existe uma série de tentativas da grande mídia internacional de lançar uma “cortina de fumaça” entre os fiéis e a figura de Jesus para impedí-los de ter um contato direto com o Jesus dos Evangelhos. A teologia liberal impede os cristãos de entrar em contato com Cristo, porque, segundo ela, Ele não fez milagres, não multiplicou pães, não curou leprosos, nem ressuscitou. Coisas absurdas assim são ditas em faculdades de Teologia. Mas o Sumo Pontífice, atento às necessidades do mundo moderno, vai lançar um livro, no primeiro semestre deste ano de 2007, sobre Jesus Cristo, cujo título vai ser “Jesus de Nazaré, do batismo no Jordão até a transfiguração”.
Bento XVI é o maior teólogo vivo da atualidade. Sem dúvida nenhuma, este livro nos dará acesso ao Jesus dos Evangelhos.
REPORTER: Como está a expectativa do senhor para a V Conferência Geral do Episcopado da América-Latina e do Caribe?
Padre Paulo Ricardo: O mais importante é a presença do Papa Bento XVI no Brasil. Nós, brasileiros, temos de nos dar conta do dom e da graça que é a presença desse homem entre nós. Ele é um Papa diferente de João Paulo II, porque ele não vai visitar os países do mundo inteiro. Primeiro porque ele já foi eleito Sumo Pontífice com idade avançada - este ano ele completa 80 anos - ou seja, 20 anos a mais que João Paulo II, quando este foi eleito. Ele não visitou os Estados Unidos, nem visitou a maior parte dos países europeus. O “centro do mundo”, de onde surgiram os interesses mundiais, não foi visitado por ele. Por esta razão, o fato de Bento XVI visitar o Brasil é um momento de graça e de derramamento do Espírito Santo sobre a Igreja brasileira.
O maior segredo da Igreja do Brasil, que ela mantém guardado “a sete chaves”, chama-se Papa Bento XVI. Ninguém o conhece bem. A Canção Nova é praticamente a única mídia que apresenta com freqüência as visitas, aparições e pronunciamentos dele. Há também algumas outras redes de televisão católicas, que, vez por outra, transmitem alguma coisa dele. Da parte do clero, até mesmo - eu ouso dizer - dos bispos em geral, existe um silêncio em relação à figura de Bento XVI. Ninguém fala dele, muito menos a grande mídia. E quando falam é para criticá-lo ou para dar uma má notícia.
REPORTER: A que se deve isto?
Padre Paulo Ricardo: Isso se deve ao preconceito em relação à figura do Papa Bento XVI no Brasil. No dia em que ele foi eleito, os jovens se abraçavam na Praça de São Pedro, e o povo o aclamava, contente, feliz, pulando e ovacionando. No intervalo, uma jornalista se voltou para um sacerdote e perguntou: “Padre, se esse homem é tão conservador assim, porque o povo o está aplaudindo?” É essa a mentalidade que reina aqui no Brasil, é como se Bento XVI fosse algum nazista inquisitorial, que está aí para acabar com a liberdade democrática. Mas ele não é nada disso. Isso é uma imagem desleal que fazem dele, é uma caricatura horrível dele. Ele é um homem inteligente, extraordinário, mas, para o Brasil é como se ele não tivesse sido eleito ainda, é como um “segredo” inacessível.
Não podemos deixar que este grande homem de Deus morra sem que ninguém note que ele foi dado por Deus à Igreja!
Não podemos deixar que este grande homem de Deus morra sem que ninguém note que ele foi dado por Deus à Igreja!
REPORTER: João Paulo II nomeou o senhor, em 2002, como consultor da Sagrada Congregação do Clero em assuntos de Catequese. Qual é a sua missão nesse sentido?
Padre Paulo Ricardo: Trata-se do Conselho Internacional de Catequese. São sete pessoas do mundo inteiro escolhidas pela Santa Sé para aconselhar o Vaticano em termos de catequese. Em 1992, a Igreja Católica publicou o Catecismo da Igreja Católica. Em 2002, foi convocado um Congresso Internacional de Catequese no Vaticano, onde estavam presentes vários cardeais especialistas em catequese do mundo inteiro, inclusive o então cardeal Ratzinger.
Fui convidado a fazer uma preleção a respeito da situação da catequese no Brasil. Uma das coisas que eu disse, e que repito agora, é que a catequese no Brasil precisa mudar, porque, infelizmente, muitas pessoas ligadas à mentalidade da “Teologia da Libertação” quiseram fazer da catequese um instrumento de transformação social. Para essas pessoas, a finalidade dela [catequese] não é instruir o cristão na fé, mas lhe transmitir valores sociais para implantar o socialismo.
Fui convidado a fazer uma preleção a respeito da situação da catequese no Brasil. Uma das coisas que eu disse, e que repito agora, é que a catequese no Brasil precisa mudar, porque, infelizmente, muitas pessoas ligadas à mentalidade da “Teologia da Libertação” quiseram fazer da catequese um instrumento de transformação social. Para essas pessoas, a finalidade dela [catequese] não é instruir o cristão na fé, mas lhe transmitir valores sociais para implantar o socialismo.
As crianças e jovens que chegam à recepção dos sacramentos não têm a mínima idéia do que seja a fé verdadeira e as principais doutrinas da Igreja, porque a catequese brasileira está obcecada com a transformação social. O problema é que a catequese foi criada para fazer bons cristãos, mas esses senhores de tendências marxistas têm “na agenda deles” que o importante é transformar a sociedade e trazê-la mais próxima do socialismo. Assim, “vende-se” a catequese para esse tipo de finalidade, que não é a finalidade da própria natureza da obra catequética.
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